sábado, 21 de março de 2015

Quem não tiver telhados de vidro...

Todos os dias deparo-me no facebook com frases pré-feitas sobre o julgamento que as pessoas fazem umas das outras, "dicas", indiretas das vítimas desses julgamentos para os algozes que os fazem. São frases que dão que pensar mas só por uns segundos porque logo a seguir aparece uma foto ou um "estado" de alguém que nos faz pensar "tssss olhem-me para isto, não tem vergonha" ou então "deve pensar que é boa/bom" ou então "txeee foi para a rambóia assim vestida/o?". E por muito que isto nos custe a engolir, é verdade, acontece. Já me aconteceu a mim, já aconteceu a ti, já aconteceu ao teu vizinho, acontece a toda a gente. Não vale a pena fazer-mo-nos de indignados e fingirmos que somos uns fofinhos e salvadores da honra dos outros porque muitas das vezes nem da nossa sabemos cuidar quanto mais da dos outros! A verdade é esta e não há outra: todos fazemos juízos de valor.
E porque é que isto acontece? Simples; porque nascemos já com essa tendência e crescemos com ela. A menos que alguém seja filho de algum aspirante a budista que esteja sempre zen com tudo e todos, mas até esses são seres humanos, portanto, consciente ou inconscientemente também fazem juízos de valor.
Vivermos em sociedade faz com que sejamos assim, estamos sempre a procurar a aprovação dos outros devido à necessidade de lhe pertencermos e por muito que tentemos emancipar-nos disso, não dá.
Isto não implica que não sejamos nós próprios, verdadeiros, nada disso, mas julgar os outros está tão intrínseco que é quase tão normal como respirarmos.
A boa notícia é que a passividade com que fazemos juízos de valor pode ser atenuada se nos esforçarmos para tal. Não é virarmos santos, não é nada disso! O atenuar a forma como julgamos os outros é um trabalho tal e qual como ir à escola, só que neste caso a escola é a vida e os professores são os outros. É na maneira como nós sabemos que olhamos para as atitudes e comportamentos dos outros que vamos buscar as ferramentas necessárias para trabalhar isso, é usar os outros como um espelho nosso porque, se pensarmos bem, todos nós somos o reflexo uns dos outros. O ditado é antigo e é bem certo "nas costas dos outros vemos as nossas" e a verdade é esta, é na convivência com eles que nos conhecemos porque ao fim ao cabo somos "todos diferentes mas todos iguais".
Por exemplo, aquelas amigas que se juntam para ir à missa, que comungam e que até costumam confessarem-se e que assim que saem da igreja uma diz para a outra "já viste a fulana tal? agora anda toda bem vestida, tem um marido em casa e filhos e eu soube pela ti Maria que o neto a costuma ver em bares e em bailaricos das terrinhas. Cá para mim anda a pôr os palitos ao pobre coitado e ele sem saber, é mesmo desenvergonhada!", quem é que já não ouviu este tipo de coisas ou já não foi vítima deste tipo de julgamento? A pergunta é, o marido é delas? E porque é que a mulher não pode sair para se divertir? Acaso a maneira de ver o casamento tem que ser igual à forma como elas o vêem? O facto de sair é sinal de que vai desrespeitar a família? E o andar bem vestida sai dos bolsos delas? Acaso a mulher lhes pede alguma coisa ou que lhes pague as dívidas ao final do mês? São elas que trabalham para meter comida na mesa em casa? Não, obviamente.
E se fosse ao contrário? Se fossem elas as vítimas desses julgamentos? Acaso iriam sentir-se bem?
Eu sei que a tentação é grande, sai-nos muitas vezes sem darmos por ela mas o importante é termos consciência de quando estamos a julgar o outro, parar para pensar e fazermos algo que é-nos tão difícil ainda: colocar-mo-nos no lugar dele, pensarmos de quando somos nós a estar naquela situação ou se algum dia estivéssemos nela se gostaríamos que os outros fizessem o mesmo tipo de julgamento acerca da nossa pessoa.
Quem não tiver telhados de vidro que atire a primeira pedra: isto serve para mim, para ti e para todos. E lembra-te, hoje és tu o juíz amanhã serás o julgado.


ML

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