segunda-feira, 30 de junho de 2014

Uma dor com nome: Judite.

Eu não conheço a Judite de Sousa sem ser da televisão. Nunca a vi muito em "cena" até porque a televisão deixou de ser, há muito tempo, a minha companheira que me atualizava sobre o que se passa no país e no mundo. Há divórcios inultrapassáveis, ponto final.
Mas não é da televisão que venho falar, nem de jornalismo (que disso percebo pouco ou nada). Venho falar como mãe de um miúdo de 4 anos a outra mãe com um miúdo de 29.

Aqui as palavras são duas: Judite e André.

Não menosprezando a dor do pai, obviamente, e não querendo dizer que um pai sente menos que uma mãe. Mas a dor de uma mãe não é só na alma; é no corpo também.

A Judite não me conhece. Provavelmente nunca irá ler este texto, no meio de outros tantos e de mensagens de apoio que lhe vão deixando. Mas, desde que li a noticia da morte do seu filho, senti esta urgência de lhe contar o que vai no meu coração de mãe que ficou mais pequenino e se compadeceu com a sua dor.
Eu tenho a sorte de acreditar em Deus. Não, não sou religiosa fervorosa que vai à missa todos os domingos, que faz oferendas à igreja ou o que quer que seja. Na minha crença (não falo em religião porque não o é, nem nunca será), eu aprendi que a vida na Terra é uma mera passagem. Que não somos mais do que espíritos que já nasceram e morreram uma infinidade de vezes, com um propósito. Que a morte foi um termo criado pelos homens para dar nome e rosto a uma mudança de estado.

Morte. Uma palavra bem escolhida não acha? Toda ela está impregnada de dor, escuridão, desespero, ausência de esperança, gritos e lágrimas. Uma palavra que só de ler, arrepia.
Mas a morte, como eu a conheço através da minha crença, é SÓ uma mudança de estado para o espírito. Que as pessoas, na verdade, não morrem. Que simplesmente passam para outro plano onde os nossos olhos (os da maioria) não conseguem chegar. Que continuam a sentir, a pensar, a amar. Tudo, tal e qual como aqui, mas noutro plano.
Posso lhe dizer que acredito nisto com toda a convicção! Mas quando penso que o que lhe aconteceu ontem pode, a qualquer momento, acontecer-me a mim eu sustenho a respiração e perco o fôlego.
De que nos serve a crença em Deus e na mudança de estado do espírito, se isso não enxuga as nossas lágrimas nem ameniza a nossa dor?
Qual é a lógica de se inverter a natureza das coisas: primeiro os filhos depois os pais? Qual o propósito?
Eu gostava de lhe poder dar estas respostas, Judite. Mas não posso. Porque eu própria não sei qual o propósito, eu própria sou limitada porque também eu sou mãe e não me imagino sem o meu filho por perto.
Mas de uma coisa eu sei; a Judite continua e continuará a ser mãe do seu filho. Sempre.
Foi a Judite que o gerou durante 9 meses, com muitas incógnitas e dúvidas; foi a Judite que com toda a força concentrada lhe deu a maior preciosidade, a vida; foi a Judite que o ajudou a crescer, amparando-o com amor e respeito; esteve lá nos momentos que ele mais precisou, certamente; foi com ele que a sua vida se tornou plena porque uma mulher ao gerar uma vida alcança o seu nível máximo de plenitude.
"E agora? O que é que eu faço sem o meu filho?", é isto que lhe vai na alma, não é? Porque é nesta expressão que penso, desde ontem, tentando colocar-me no seu lugar. Poderia mentir-lhe e dizer que consigo. Mas não consigo Judite, porque tal como para si, o meu filho é tudo aquilo que respiro; é um pedaço do meu corpo e perdê-lo equivalia a ficar deficiente por me faltar o equivalente a uma perna ou um braço ou um olho. O meu filho é também um pedaço da minha alma, e infelizmente, Deus levou o seu.
Cruel? Sim, talvez. Porque não era suposto ser a Judite a enterrá-lo, mas sim o contrário. Afinal, é essa a lei da natureza. Mas como vê, até a Natureza pode-nos trocar as voltas, portanto, isto leva-me a crer que nada tem uma ordem fixa; tudo é transmutável. Até a dor!
E a sua dor, vai alcançar um nível máximo nos próximos dias, bem sabemos. Mas depois... quando a chuva parar de cair, alguns raios de sol vão surgir por trás de uma (de tantas) nuvem e a Judite vai saber nesse dia que o André não morreu. Porque ninguém consegue matar nem tão pouco roubar um amor que habita em nós. A dor, neste momento, faz parte do processo desta coisa parva que é a morte. Mas acredite, Judite, não chove sempre!
E apesar de eu acreditar em tudo isto que escrevo, com toda a minha alma e entendimento, sei que tudo isto é uma grande merda porque não vejo nenhum propósito na morte de um filho, assim de repente, como não quer a coisa. Como se nós, mães, no fim de gerar, parir e criar, valêssemos nada.

Nem que se juntassem 1 bilião de pessoas para a abraçar... não iria cobrir o buraco que acabou de ser feito no seu peito, qual buraco negro criado no universo, eu sei.
Mas, Judite, no universo também nascem supernovas.

"A dor precisa de ser sentida", diz o livro "A culpa é das estrelas", por isso, agora é o seu momento. Sinta-a e não deixe nada por sentir, nem um fio, nem uma ponta solta! Apenas sinta.
"E depois?", pergunta. Depois, é hora de regressar a casa e reaprender a fazer uma coisa que nós seres humanos temos imenso jeito para fazer: viver.
O André? Estará sempre onde sempre esteve; em si. E quando o quiser encontrar para lhe dizer que o ama é no seu coração que ele estará, à sua espera para a receber, como a Judite o fez quando ele nasceu.
O André é o amor da sua vida, tal como todos os filhos são para todas as mães. E a morte, jamais, mudará isso.
Deixo-lhe as palavras que retive de um filme "Winter's Tale":

"E se tivesse havido um tempo em que não havia nenhuma estrela no céu?
 E se as estrelas não fossem o que julgamos?
 E se a luz que vem de longe não vier dos raios de sóis distantes, mas das nossas asas quando nos tornamos anjos?
 O destino chama cada um de nós. E há um mundo por detrás do mundo, onde estamos todos ligados. Todos parte de um grande plano em movimento.
 A magia rodeia-nos por completo. Só é preciso olhar. Olhem. Olhem com atenção.
 Pois nem o tempo nem a distância são aquilo que parecem ser.
 Quando o amor verdadeiro se perde… a vida pode esvair-se até perder todo o sentido. Ficamos vazios. Mas a possibilidade do destino permanece.
 Aquilo para que estamos destinados pode ainda ser descoberto. E por vezes, muito de quando em quando, essa viagem em busca do nosso destino pode vencer até o tempo.
 E se fossemos todos únicos e o universo nos amasse a todos por igual? Tanto, que recorreria a impossíveis, através dos séculos, por cada um de nós. E, de vez em quando, teríamos a sorte de o compreender.
 Nenhuma vida é mais importante do que outra. E nada existe sem um sentido. Nada.
 E se todos fossemos parte de um grande padrão que um dia entenderíamos? E quando um dia tivéssemos feito o que só nós somos capazes de fazer, nos elevássemos e nos reuníssemos com aqueles a quem mais amámos, abraçados para sempre?
 E se afinal nos transformássemos em estrelas?"


Deus estava com falta de anjos, e o André aceitou o desafio.




ML



sexta-feira, 27 de junho de 2014

Até onde é capaz de ir a podridão da mente humana?

Como sabem, e para quem tem interesse naquilo que escrevo, este blog é recente e aqui me propus a falar de mim: do que passou, do que fui, no que me tornei, o bom e o mau que me vai acontecendo; um blog de partilha de mim para vós. E como opiniões também são pedaços de partilha daquilo que penso e sinto, hoje venho-vos falar sobre um "texto" (se é que aquele amontoado de frases pode ser caracterizado como tal, mas deixo isso para os entendidos em escrita) acabadinho de ler num blog vizinho (que FELIZMENTE não sigo), e que dei de caras por acaso, ou talvez não.
Não conheço o seu autor, e dispenso obrigada, mas pelo que escreveu sobre um tema que me é muito familiar não só pela minha experiência nele mas também como futura psicóloga, diria que é uma pessoa que das três uma: ou tem um distúrbio de personalidade tão grande que não tem sequer a percepção disso, ou foi destituído de uma coisa que se chama "bom senso", ou então não bate bem do miolo. Se não vejamos; começando pela parte inicial do texto...

"No meu tempo não havia bullying, havia porrada, normalmente no intervalo."

Até aqui tudo bem, o senhor explicou em palavras grosseiras o que significa o estrangeirismo "bullying". Mas continuando...

"No meu tempo os campos eram de gravilha e vidros, os parques infantis de areia com cocó de cão e seringas e os escorregas e baloiços tinham ferrugem e pregos soltos prontos a espalhar o tétano. Hoje em dia é tudo almofadado, alcochoado e desinfectado."

BEM-VINDO À CIVILIZAÇÃO AMIGO!!! Andava perdido em que anos? 80? Desculpe lá se a civilização melhorou, se as condições de higiene e dos materiais proporcionaram mais bem-estar à gente que quer ser civilizada, especialmente às nossas crianças... Imagino que regressar dos anos 80 direitinho para o século 21 tenha sido uma tarefa árdua e que ainda hoje se revolte com as criancinhas (malvadonas!) que têm a sorte de poderem brincar em locais um pouco mais limpos e seguros (deviam todas apanhar tétano só por causa das tosses!) do que aqueles por onde sua excelência andou. Inveja? Parece-me que há por aí muita. Mas continuando...

"Andamos a mexer com a seleção natural feitos parvos e vamos acabar por estragar a evolução da nossa espécie."

De qual a se refere? À sua ou à minha? É que, vamos lá entender uma coisinha, o bullying não é uma "cena" natural. Para os animais sim; é mais ou menos praticando "bullying" que se alimentam e ditam as suas regras, e consequentemente sobrevivem. Apesar de sermos animais temos uma coisa que nos distingue do todos os outros: racionalidade. E tenho cá para mim que o senhor não faz uso da sua, é uma pena.
Mas pegando na sua expressão de "mexer com a seleção natural", repare só na definição de seleção natural: "o conceito básico de seleção natural é que características favoráveis que são hereditárias tornam-se mais comuns em gerações sucessivas de uma população de organismos que se reproduzem, e que características desfavoráveis que são hereditárias tornam-se menos comuns." No seu entendimento, nós, pais, somos os xoninhas porque temos as tais características desfavoráveis que são hereditárias e por isso andamos a lixar isto tudo porque andamos a cuidar melhor das nossas crianças, a protegê-las do que as possam colocar em perigo e prepará-las melhor para a vida que as espera, a torná-las mais humanas; ao invés de as deixarmos seguir as suas tendências naturais que é rebolar em areia com cocó de cão e brincar em baloiços quase a caírem e com parafusos soltos cheios de tétano (todas as características favoráveis que tornariam as próximas gerações rijas como o aço). Deixe-me dizer-lhe que além de necessitar, urgentemente de aulas de biologia sobre seleção natural também necessita de aulas intensivas de "como ser menos burro". Mas, prosseguindo.

"Se um puto ranhoso decide que se deve mandar de cima do escorrega, num mortal encarpado à retaguarda, quando nem o pino sabe fazer, e se esbardalha com os dentes no chão ou enfia um prego ferrugento no escroto, quem somos nós para impedir? É deixá-lo ir."

Se fosse pai; mais, se fosse um ser humano consciente, acredite, não diria isto. Faz parte da nossa responsabilidade enquanto seres sociais impedir que desgraças aconteçam quando estamos prestes a presencia-las. E como mãe e ser humano lhe digo que é mesmo assim! Se eu estiver num parque com o meu filho e vir que uma criança está prestes a magoar-se eu vou lá e ajudo-a e alerto os pais; e isto não é ser xoninhas, é ser consciente. Porque se fosse com o meu filho, quero acreditar que fariam o mesmo (apesar de saber que existem mais bestas ao cubo como você que "deixariam ir"). Não me diga que estava lá no dia que a Kitty Genovese foi assassinada?!
Continuando com a dissecação do seu post miserável...

"Hoje em dia uma mãe bate num puto e tem os Serviços Sociais à porta e uma professora fala alto com um miúdo e tem os pais a quererem explicações à base do punho."

Olhe que tanta generalização faz-lhe mal, pode provocar-lhe azia e lá se vai a sua oportunidade de transmitir "rijeza" aos seus pequenos póneis vindouros.
Como futura psicóloga posso-lhe garantir que isto não é assim linear: "Comé? Bateste no puto? Porquê? Levas uma berlaitada nas trombas que até arrotas a presunto!" (Isto na Buraca certo?).
Acontece sim, especialmente com pais que vivem à roda dos filhos, que não sabem estabelecer limites e protegem as suas crias contra tudo e todos, até da boa educação. Acredite, tenho um exemplo disso mesmo, mais perto do que imagina! Portanto, sei bem do que falo. Há casos e casos. Mas também lhe posso garantir que não é dar "porrada" nos putos que eles aprendem alguma coisa. Sabe o que eles aprendem? A respeitar regras e pessoas por medo, só isso. E depois quando chegam à idade da adolescência e até mesmo adulta é o que se vê: marginalismo e desrespeito pelos outros até mais não.
Quer um exemplo? Eu dou-lhe. O meu pai levou muita pancada do meu avô e ele acabou por fazer o mesmo ao meu irmão mais velho. Sabe qual foi o resultado disso? Nenhum. Sim, leu bem: NENHUM. E sabe porquê? Porque hoje, já adulto, é uma pessoa desprezível, sem respeito por si próprio nem pelos outros; foi capaz das maiores atrocidades que possa imaginar. Portanto, como vê, pancada não resultou a longo prazo. E vou mais longe: "Eu levei muita porradinha, a minha mãe chegou-me a atirar um rissol congelado, em género de estrela ninja, que se me tinha acertado era coisa para abrir lenho no sobrolho. Só me fez bem, não que merecesse, mas ensinou-me movimentos semelhantes ao do Neo no Matrix, que na minha zona dão jeito.", posso retirar desta frase que levar porrada da sua mãezinha não lhe adiantou nada, só lhe ensinou mesmo os movimentos do rapazito do Matrix. Porque, perante tal modo de escrita e conteúdo só posso extrair que educação não tem nenhuma e que caráter e bom senso lhe faltam em abundância! Mas isto já são juízos a mais para uma noite só.

Deixe-me que lhe faça uma pergunta: o que é que importa mais para si, ter crianças com a barriga cheia de pancada mas que no futuro vão ser uns marginais, ou crianças com a barriga cheia de princípios e valores transmitidos na base do amor e do respeito?! Pois. Nem vale a pena esperar que me responda porque temo que amor e respeito foi o que mais lhe faltou na infância.
Que fique bem claro, para si e para toda a gente, que a função dos pais não é "esconder" as suas crias debaixo das saias e protegê-las dos lobos maus que andam por aí à espreita. A função dos pais é dar o exemplo, porque exemplo gera exemplo, porque respeito gera respeito, valores gera valores e por aí em diante. Existem sim, pais que tratam as crianças como pedaços de cristal que não se podem quebrar, e depois têm a infelicidade de fazer figuras tristes como aquelas que fala no seu "texto". Mas não são todos assim, eu pelo menos não sou e se valer a pena pela diferença, então já ganhei o mérito! Portanto, cuidado com o que diz; generalizar não me parece que seja um exemplo credível para alguém que nem pai é, quanto mais entendido em questões de psicologia.
A culpa do bullying, caro senhor, não é das crianças (malvadonas!), é dos pais que de uma forma inconsciente ou consciente, esquecem-se que tiveram filhos e que eles não se criam sozinhos, não aprendem a ser gente sozinhos. Pois é, isto é outra coisa que vossa excelência não sabe mas que deveria ter aprendido (se tivesse estudado alguma coisa decente) é que nós humanos nascemos munidos de instintos de sobrevivência e que somos o único animal que nasce mais frágil  e que necessita de cuidados e acompanhamento durante um longo período da sua vida. Portanto, não nascemos ensinados.

E no meio de tanta estupidez junta acabou por encontrar a charada para a causa maior do bullying: a falta de amor e de compreensão por parte dos pais: "Não foi preciso grande coisa para acabar com isto, foi só convidá-lo para jogar à bola com o meu grupo e enturmá-lo. Acabaram-se os abusos porque ele deixou de estar sozinho e de ser um alvo fácil. Basta coisas destas para se acabar com o bullying.". Pois é, aqui reside a solução: o bullying não é mais do que uma mão cheia de emoções negativas concentradas num pequeno ser que nem espaço tem para carrega-las.
Encare isto como uma garrafa de coca-cola (gosta? ou isso é só coisa de crianças mimadas?): você abana a garrafa durante um certo tempo e o gás que contém vai fazendo uma tal pressão que se tem o azar de a deixar cair e ela abrir-se você fica todo molhado, embebido em açúcar que lhe vai dar uma sensação nada agradável. Assim são as crianças carentes de atenção e afeto por parte dos pais. E não me venha dizer que as criancinhas, filhas de papás riquinhos também são bullies e que isto deita por terra a minha (que em nada é minha) teoria, porque até essas têm carência de alguma coisa.
E aquele timorense que convidou para jogar à bola era uma garrafa que estava a ser abanada à muito tempo. Ainda bem que não a abriu e contribuiu para que o gás se acalmasse, nem que fosse por aqueles pequenos momentos de jogar à bola que o ajudaram a integrar-se! Valha-nos ao menos uma coisa acertada que tenha dito.

"As crianças são más, sempre foram, talvez sejam piores agora, não sei."

A sério que li isto?? Mas onde é que você (e outros que pensam assim) está com a cabeça para dizer uma coisa destas?? Virgem Maria, isto é o auge de toda a ignorância! Como é que uma criança é má?
É UMA CRIANÇA!!!! E ser-se criança é assim: tem-se o coração na boca, tem-se demasiada verdade incontrolada dentro do peito. Os pais é que são ridículos porque reprimem isso nas suas crianças, ao invés de lhes ensinarem a dizer e ser verdade sem com isso magoarem ou desrespeitarem o outro! É essa a nossa obrigação enquanto pais! Não é torná-las xoninhas; é torná-las gente.

"É verdade que com o bullying também vamos ter alguns que ficam traumatizados e com problemas para a vida toda, mas é um sacrifício necessário."

Quer um conselho? Faça um favor a si mesmo e à humanidade: não tenha filhos. Correrá um forte risco de um deles ser um dos "alguns que ficam traumatizados e com problemas para a vida toda" (e com um pai assim, a probabilidade é alta). E, acredite, seria um sacrifício desnecessário para si assistir a isso.

Um conselho aos pais que, como eu, querem o melhor para os seus filhos:  prestem atenção, cuidem das vossas crias como pedaços (que são) vossos. Eles serão tudo aquilo que vocês lhe mostrarem que não tem mal ser, eles serão o vosso reflexo no futuro, eles serão bullies se assim vós permitirdes porque os bullies somos nós pais que geramos debaixo do nosso teto. Como, perguntam vós? Simples. Carência de atenção e afeto são os principais ingredientes, o resto serão só circunstâncias até que a garrafa de coca-cola expluda.
Que sejam felizes e façam as vossas crianças felizes, conscientes de que a vida é uma roda em constante movimento; o que dermos ela traz de volta.

ML







quarta-feira, 25 de junho de 2014

E quando já nada me surpreendia...

Depois de te ter contado algumas das minhas "novidades" desde o tempo em que ficamos afastados, eis que me dizes isto:

"...Fogo passaste um mau bocado nestes últimos meses... Como é que tens o pé partido à 3 meses?! E eu não sei?! À 3 meses que não te vejo?! Como é que é possível?! E a recuperação apesar de lenta foi boa?! Tens que voltar a dançar :) "

- "...Bom, já não nos vemos à quase 2 anos. A última vez foi no dia 18 de setembro de 2012."

Em que ano estás Wilson?? Só assim, naquela, para poder entender o teu raciocínio. Como é que tu não sabes que tenho o pé partido à 3 meses? Simples. Porque à muitos mais que não nos falamos. Há 3 meses que não me vês? Epa, feitas as minhas contas (mesmo não percebendo um cú de matemática) já lá vão 2 anos!
Gostava de ter visto a tua cara ao ler a minha resposta... Foi por isso que não respondeste, eu sei. Chapar nas trombas a verdade ridícula que tu finges não ver (ou não queres, não sei) é chato.

Ups, tirei-te a oportunidade de fazer conversa bf (best friends)!

Das duas uma: ou me confundiste com outra "Márcia" (o que é altamente improvável porque respondeste-me à primeira mensagem como se soubesses quem eu era, logo, parto do principio que não apagaste o meu numero) ou então estás a gozar com a minha cara. Porque, no fundo, sempre foste assim. Afastava-mo-nos e volvidos alguns meses voltavas com conversas de treta e ladainhas cheias de saudades, como se fossemos os "best friends".
Tens que idade mesmo? É que às vezes nem dá para acreditar que és SÓ um ano mais novo que eu...

Sabes o que me custa no meio disto tudo? É que, infelizmente, não existem borrachas que apaguem pessoas da nossa vida, da nossa história. Porque se houvesse, acredita, eras o primeiro que eu apagava.
Ainda assim, apesar de seres assim, o meu coração teima em amar-te e querer-te. Não há duvidas: o amor tem razões que até a própria razão desconhece. Mas no meu conceito, isto é ser estúpido!
E agora, o que é que faço com "isto"? Pois. Nada. Absolutamente nada. Falta-me a borracha!


ML



terça-feira, 24 de junho de 2014

Faltava falar de ti

Iniciar uma conversa sobre ti não é coisa fácil; nunca foi. Mas o facto é que a partir do momento que comece a falar de ti, tudo flui, tudo sai naturalmente.
Uma das coisas que eu costumo dizer é que a nossa relação foi repartida no tempo cronológico, em 3 partes.
A primeira parte foi desde que eu nasci e soubeste que eu era rapariga, até aos meus 7 anos; eu sei que uma menina era aquilo que mais querias mas já tinhas perdido a esperança porque, entretanto, já tinham vindo dois rapazes, os manos, e a vida na altura era bastante difícil para ter mais um. Mas lá vim eu, de surpresa. O que eu me ri quando soube que tinha sido o resultado de um preservativo furado; tal era a minha gana de vir ao mundo!
Não me lembro da primeira vez em que me pegaste ao colo, mas pelo que a mãe dizia, tinhas medo de me pegar porque já tinha sido assim com os outros dois; brincavas e mexias nas minhas mãozinhas, mas distante. Já aqui a tua capacidade para demonstrar o teu amor já estava a ser testada e tu nem percebeste... Até aos meus 7 anos, lembro-me de ti super protetor, embora muito ausente; lembro-me das tuas palmadinhas no rabo (a brincar) que às vezes me irritavam profundamente, mas era das poucas coisas que nos mantinha próximos. Pode parecer esquisito, mas foram as pequenas brincadeiras contigo (das quais, muitas não me lembro, infelizmente) que me faziam olhar para ti com um olhar deslumbrado.
Depois dessa idade, não sei porquê, senti-te a afastares-te, senti-te mais frio. E foi aí que comecei a estar pouco em casa: ora ia para casa de uma avó ou ia para a casa da outra.
Eu sei que tinhas que trabalhar para trazer sustento para casa, para nos dares o melhor que podias. Mas, sabes, faltou tanta coisa essencial... Muito mais do que um prato de comida! Apesar dos teus sacrifícios, acredita que passei muita fome daquilo que eu sempre soube que tinhas em abundância: amor.
Contudo, é desta fase que guardo as nossas melhores memórias; poucas mas nossas.
A segunda parte foi quando entrei na fase da adolescência, uma fase complicadíssima da tua e da minha vida. Houve tanta coisa que aconteceu e que tu não soubeste; houve tanta coisa que me magoou e que eu guardei com tanto rancor dentro de mim, que me roeu durante anos, até à pouco tempo. Na altura eu tive que lidar com as minhas dores da infância somadas às dores de me sentir a crescer; crescer significou afastar-nos mais ainda do que já estávamos. E eu não queria!
A adolescência foi o meu tempo terrível, e ambos concordamos com isso. Foi ali que eu mais precisei de ti; do teu colo, do teu abraço, do teu beijo, das tuas palavras sábias (que sempre tinhas para os outros, menos para os teus filhos), do teu silêncio para me ouvir. E as birras que eu fiz para te captar a atenção?Incontáveis.
Lembras-te da primeira tentativa de suicídio? Ali foi o expoente máximo do teu medo, lembro-me que foste com a mãe até ao meu quarto e que pediste para conversar comigo. Já era tarde, pai. Eu ali já não ouvia ninguém porque tu e eu já não falávamos a mesma língua à muito tempo, já estávamos tão distantes que era como se tivéssemos, cada um na janela da sua casa, frente a frente, a tentarmos comunicar com uma imensidão de ruído à nossa volta.
Lembro-me de teres dito, a chorar, que tu e a mãe amavam-me muito, que não entendiam o que se passava comigo e que queriam entender. A minha voz estava demasiado embargada para dizer o que quer que seja porque, para vos dizer o que se passava eu tinha que recuar muito no tempo, tinha que vos contar as coisas que vos passaram ao lado e que me racharam ao meio; a dor era tanta que as palavras dissolviam-se nela. E a última coisa que me disseste foi "nós gostamos muito de ti e estamos aqui para o que precisares". E saíram do meu quarto. A verdade é que nunca estiveram.
Com 12 anos não era suposto ter que conversar com vocês como adulta, apesar de com 6 anos a minha professora primária vos ter dito, aos dois, que eu tinha bastante maturidade e que eu preferia conversar com adultos do que com os miúdos da minha idade e que isso era bom, mas mau ao mesmo tempo porque me poderia trazer problemas no futuro. E não é que trouxe mesmo?! Acho que te esqueceste disso, e partiste do principio que a tua menina não iria dar trabalho como os manos, porque ela era a bebé crescida!
Pai, eu sempre fui um ser humano normal, não uma sobredotada; e até mesmo esses também sofrem.
Cresci na dureza; sozinha; a ter que compreender muitas das coisas que é suposto um pai orientar para as compreender; tive que aprender como se lutava por aquilo que eu queria para a minha vida, sem saber muito bem como isso se fazia; tive que aprender a chorar sem colo; tive que me construir com as pedras que a vida me ia dando.

Estive muito longe de alcançar o castelo, pai.

Com o vir para Lisboa e com o nascimento do Gabriel, voltei a precisar de ti. Essa foi outra fase importante da minha vida, da qual não fizeste parte. Não bastava a oscilação hormonal, dita normal num pós-parto; ter que me adaptar a uma nova vida com um bebé nos braços sem saber como agir e reagir com ele; ainda tive que lidar com a tua distância, mais uma vez.
Talvez tivesses pensado que eu tinha todo o suporte que necessitava (e tive), e que não iria fazer diferença se estivesses aqui ou não. Porra, pai! Depois da minha adolescência, esse foi outro momento importante (se não o mais importante da minha vida) em que eu precisei desesperadamente de ti! Sabes o quanto foi difícil ser uma coisa que nem tu nem ninguém me tinham mostrado como ser; mãe? Sabes o quanto foi difícil dar o que eu não sabia como dar? Acredita, não há nada mais assustador do que ter um bebé nos nossos braços e perguntar "e agora, o que é que eu vou fazer contigo?".
E foi assim até ao primeiro aniversário dele; andei num misto de rejeição, de revolta e de culpabilização. O desespero foi tanto, que cheguei ao ridículo de culpar o pai do meu filho por me ter engravidado...
Eu gritei por ti, mas não tinhas ouvidos para ouvir.
Mas mais uma vez, a vida foi-me orientando, Deus foi-me mostrando o caminho (porque foi a ele que me agarrei para sobreviver), e eu fui crescendo até àquilo em que me tornei hoje.
A terceira parte do nosso tempo cronológico, começou à 1 mês. Quando a tua casa caiu e se estilhaçou toda, foi aí que me ouviste, foi aí que te disse tudo aquilo que aos 12 eu não consegui. Falei-te da tua ausência, da tua falta de afeto e atenção, das coisas más que me fizeram debaixo do teu nariz e que tu nem percebeste.
Eu magoei-te, pai. Desculpa.
Não que eu tenha tido alguma culpa, não! Peço desculpa, porque aquilo que não conseguiste fazer: proteger-me; a dada altura eu vi-me a fazê-lo. Queria-te poupar, queria manter-te à margem de mais dor, queria ilibar-te da culpa; só queria ajudar-te a seres feliz.
Não é isto que um pai e uma mãe fazem?
Sei que a verdade também faz crescer e sei que dar-ta, fez a diferença. Também sei que hoje vives num mar de culpa e sofrimento por descobrires, finalmente, o quanto eu sofri durante estes anos todos na tua ausência.
Mas pai, eu estou bem!
Eu não construí um castelo, mas ando a construir uma casa com pilares de cimento. Ainda não a acabei, é verdade; talvez com a tua ajuda eu tivesse construído uma mais depressa, e talvez esta que hoje construo um bocadinho, todos os dias, não esteja totalmente pronta até eu morrer. Mas sabes o que me consola? É que esta casa abrigará o meu filho, e outros que Deus me queira dar. Eles só terão que a melhorar, porque crescer também passa por aqui: tornar a nossa casa confortável para que a vida seja mais suportável, porque fácil ela não é. A nossa função como pais é só deixar um legado; do que somos e do que vivemos. O resto é com eles, é dar-lhes asas e quando estiverem prontos, eles voam.

Crescer sem ti foi muito chato, pai! Mas apesar disso, cresci e estou a desabrochar de uma forma bonita. No fundo, a tua vida deu-me algumas lições, porque ao olhar para ti eu vejo um exemplo daquilo que não quero ser nem fazer. E acredita, isto não é ironia, é mesmo bom.
Ao ter a tentação de ser e fazer com o meu filho aquilo que tu fizeste comigo (os hábitos são muito fortes pai, acredita), lembro-me de que não quero ser como tu, volto atrás e corrijo a tempo. E tu sabes que é assim; nas nossas conversas, no modo como me vês a educar o Gabriel e quando lhe digo as coisas como elas são sem medo e sem inventar, nas brincadeiras com ele; tu vês a mãe em que me tornei.
E isto não quer dizer que não te ame! Nada disso. Durante este tempo, aprendi a amar-te de uma forma tão bonita, tão genuína, tão pura. Não tenho qualquer medo de to dizer! E tu sabes isso.
Porque pai, eu vejo que apesar da tua idade, também estás a crescer e isso deixa-me feliz.

Ultimamente tenho pensado muito em ti, do que passou, do que fomos um para o outro, da minha evolução, e cheguei a uma conclusão: por tudo o que aprendi e vivi, por tudo aquilo que me tornei hoje, eu não te trocaria por nenhum outro pai. E se eu tivesse que voltar a renascer, eu só queria se existisses tu!
És um amor insubstituível, és um pai que não foi perfeito mas és meu e abençoada fui eu por te ter! E isto pode parecer contraditório, tendo em conta o que sofri na minha vida. Mas não é, e sabes porquê? Porque apesar das dificuldades, tu deste-me a maior preciosidade que um ser humano pode dar a outro: a vida. Só isso, é o suficiente para eu te ser eternamente grata.
E se isto não é amor, na sua forma mais pura e perfeita, então não sei o que é o amor.






ML



segunda-feira, 23 de junho de 2014

Peguei no telemóvel, seleccionei o teu nome e esperei...

"Bip...bip..." - e desliguei. Não te queria ouvir. Passado uns minutos, uma mensagem:

- Agora não posso falar... ligo mais tarde.

(depois de ficar a olhar durante um tempo, não sei ao certo de quanto...)

- Não é nada de importante. Só liguei por ser a única forma de ouvir do outro lado que estás vivo e por ser a única maneira de me aproximar de ti, nem que seja por um simples "bip".

- Hahahahah tão fofa! Estou a trabalhar, por isso não posso atender; anda tudo em ordem, à um mês e meio que não vou ao atelier lolol e agora sem carta é impossível. Sintra margem sul, margem sul sintra. 
E tu meke estás?! Temos de combinar qualquer cena ao fim-de-semana. Espero que estejas bacaninha!!! Beijinho ;)

- Estou bem. Com saudades tuas, ainda não aprendi a viver na tua ausência, que se há-de fazer... um beijinho

...

É como se o tempo, para ti, não tivesse passado. Como se estivéssemos ainda presos em Agosto do ano passado; a última vez que falamos. 
Falas-me de ti com uma facilidade louca, como se fossemos velhos amigos que não se vêem há imenso tempo mas que continuam unidos pelo pensamento (pelo coração, só eu). 
Combinar "qualquer cena ao fim-de-semana"? Não me parece. Não agora que ainda estou tão frágil, tão carente de ti. Seria cometer um suicídio certeiro! 
Estás vivo, é o que me importa. Que diferença faz isso? Toda! Pelo menos sei que o mesmo ar que me beija todos os dias, é o mesmo que respiras; e só isso me adocica ligeiramente a alma. 
São as pequenas coisas que me fazem amar-te; e o amor é isto: verdade! 

 


Voltei a lembrar-me de ti

No último mês, tem sido recorrente. Parece que a vida está, toda ela, impregnada da tua presença, do teu cheiro, da tua voz, do teu sorriso...
É nos sonhos, em que surges sem pedir licença; invades e pronto, tudo é teu. É num concerto, seja ele qual for; basta ter letras de dor e amor. É na rua por onde eu passe e veja um casal lamechas a trocar um carinho. É na praia, sempre que lá passo de fugida ou que lá vou para me esquecer de ti. É nos trechos de poemas ou livros que leia em que tu e eu estamos lá espelhados; eu por me doeres, e tu por teres ido.
Cheguei ao ridículo de chorar com uma música que ouvi há dias, num mini concerto do fadista Marco Rodrigues, quando ele cantou o seu fado intitulado de "ausência". Tens a noção do quanto ainda me fazes mal? Já se passou um ano e meio desde a última vez que falámos, e nem sequer houve um "adeus"! Será que a minha alma, inconscientemente, precisa disso? Acaso preciso de te dizer "adeus" nos olhos para me libertar? Ou por não ser capaz de o fazer, por ainda te querer tanto na minha vida, o "adeus" de nada serviria?
É tão frustrante...Esta urgência de te amar e expulsar ao mesmo tempo da minha mente; este desespero louco de mergulhar o meu coração num tanque de água salgada para que te afogues e ele se depure; esta agonia de um sentimento com o qual não sei lidar e querer tranca-lo num cofre a sete chaves e joga-las fora para que ninguém, nem mesmo eu, consiga abri-lo num qualquer futuro.
Eu poderia impor um diálogo entre o meu "eu" consciente e o meu "eu" estúpido, a ver se toda eu ouvia a voz da razão. Mas, eu pensava que já estavas mais que resolvido na minha vida! Aliás, desde a última vez em que cortei com todos os contactos que mantínhamos, eu estava confiante que com o passar do tempo serias uma mera miragem. Mas enganei-me. E sabes porquê? Porque percebi que, durante todo este tempo, camuflei uma cura que nunca se deu.
Deveria ter-te dito "adeus" com todas as letras, de preferência na tua cara; mas como és cobarde e foges de tudo o que possa mexer contigo, nunca me darias essa oportunidade. Mas será que se eu conseguisse chegar a ti, como eu queria, seria capaz de dizer o tal "adeus" que se faz tão urgente?
"Não, tu não eras capaz de o fazer porque a tua mania é tão forte e a tua estupidez vã é tão cega que o raio do ´adeus´ nunca iria sair da tua boca, quanto mais da tua alma..." - diz o meu "eu" consciente.
"Mas ela precisa disso, de dizer adeus. Porque o adeus é uma espada que corta os laços e cordões desnecessários à nossa vida, que nos impurificam, que nos rebaixam até muito abaixo do chão." - diz o meu "eu" estúpido.
"Estás parvo?! Tu não vês que ela está cega?! Ninguém consegue viver uma vida inteira a esbanjar amor a quem já apanhou o primeiro barco e já nem do nome dela se lembra! Achas que isso lhe faz bem?" - riposta o meu "eu" consciente.
"Olha; lá que estejas munido e vacinado contra sentimentalismos, eu não tenho culpa. Compete-me a mim que ela não se torne como tu: fria e automática. Ela ama-o, e o amor, muitas vezes dói. Isto vai acalmar com o tempo." - teima o meu "eu" estúpido.
"Um ano e meio não chegou para doer? És mesmo estúpido, e estupidifica-la. Acorda!!! A vida não é uma novela nem uma história de princesas com o maldito ´e foram felizes para sempre´. A vida é dura, e há que saber seleccionar o que nos poderá trazer algo de bom e colocar no lixo o que já não serve." - remata, ironicamente, o meu "eu" consciente.
"Insensível!"
"Estúpido!"
 E se eu não estiver no meio, a moderar este diálogo, os meus "eu's" quase que se matam; ambos trazem impregnada muito pujança e se chocarem, eu perco-me.
Já viste como me deixaste? Dividiste-me em três partes ( fora os estilhaços que não apanhei e que ficaram espalhados por essas ruas sem nome, mas vestidas com outras gentes): no meu "eu" consciente que me puxa para a realidade e me tenta fortalecer com dureza e pouco sentimentalismo; no meu "eu" estúpido que por tanto te querer, me impõe uma tal carência que quase me sufoca; e no meu "eu" do meio onde tu habitas.

Tenho saudades tuas, de tudo aquilo que fui contigo e de tudo quanto pus no que dizia sentir por ti; e era verdadeiro.
Tu estás, onde não sei; mas na minha vida já não. E isto deixou de ser frustrante; passou a ser vício. Porque basta fechar os olhos para te voltar a ter na minha pele, na minha boca, no meu ouvido, a tua cabeça no meu colo e o teu cabelo crespo por entre os meus dedos, a nossa pele unificada (a minha branca e frágil e a tua que carrega nas veias o calor, numa mistura de brasil e áfrica) pelo mesmo sentido: tesão; volto a ter-te.
Decorei-te e registei-te em cada pedaço meu.
Como é que se vive sem ti? Não se vive; sobrevive-se. E isso aprende-se vagarosamente, até a poeira do tempo assentar e fazer de ti uma miragem.
Até quando? Não sei. Até Deus querer e os meus "eu's" se entenderem; até deixares de ser o meu Wilson, que em nada foi meu, e passes a ser do mundo somente, sem eu estar presa a ti; até que estas correntes que me amarram à loucura do teu nome, que me faz desviar a cabeça na tua direção sempre que o ouço em qualquer parte do mundo, mesmo sabendo que não és tu mas com a esperança que sejas, se desfaçam e passe a ser só um sussurro dorido; até que a morte se lembre de te matar em mim, te transformes numa alegoria e volte a ser Carnaval de novo.





ML



quinta-feira, 12 de junho de 2014

Até hoje nunca me tinha permitido sentir; sim, isso é triste. Vivia sempre a vida a medo; dava-me com as pessoas e cobrava delas o mesmo que eu lhes dava; levava, até as pequenas coisas, na ponta da espada. As vezes que caí? Incontáveis. 
Mas há sempre um momento (seja em que idade for), em que paramos ou algo nos pára forçosamente, e obriga-nos a enfrentar a nossa verdade. E isso aconteceu comigo, recentemente. Não sabia que partir um pedaço do corpo (no meu caso, um pé) dava para perceber o que vai mal e o que tem de ser mudado, indiscutivelmente. Partir o pé, foi como renascer das cinzas: fui forçada a ficar parada, o que afeta qualquer pessoa que ande sempre atarefada; revoltei-me, chorei e culpei o mundo; depois dizia a mim mesma que foi pouca sorte e que foi o resultado de pragas rogadas (estava mesmo cega!); passei pela fase da passividade de "ok, a minha vida é uma merda, naturalmente e sem esforço"; até que comecei a reaprender a andar (literalmente) e com isso, percebi o caminho que tinha tomado até ali e que não era de todo aquele onde eu queria estar. Quem gosta de viver no limbo?
Foi a partir desse momento, que me desalinhei toda; foi nesse momento que voltei à casa que 2 anos antes tinha deixado, por ter perdido a minha própria fé, e onde aprendi mais algumas coisas com uma das mulheres da minha vida (que tem umas mão perigosas, de meter medo, cuidado), que é assim um ser super iluminado que deixa qualquer pessoa que entre no consultório K.O. (literalmente). É bom, mas tão bom, ver-me renascer das mãos dela; como uma mãe dá à luz um filho; como uma mãe que prepara a sua cria para a vida lá fora, ensinando-a como se voa! Cada palavra, cada conselho, cada gargalhada, é um ensinamento para mim; o exemplo de como viver bem. 
Só agora entendi que a vida sabe bem. E por ter percebido isso, por ter-me permitido sentir ("finalmente" diz ela; daqui consigo ouvir-te) e por deixar que flua, sinto que os meus pés, neste exato momento, pisam a terra do caminho certo; a terra fértil, outrora árida.
Desalinhei-me, sim. Mas é preciso desalinhar para voltar a alinhar; é preciso destruir para voltar a construir algo novo; é preciso morrer por dentro para voltar a renascer. E a vida flui, e com ela vem as coisas boas de uma forma espetacularmente natural: surgem pessoas que são capazes de me olhar como uma filha "eu quando soube que tinhas partido o pé pensei que fosses desistir do semestre e até falei com a minha mãe para saber o que te haveria de dizer para que não desistisses e para te trazer cá para cima (...) um dos meus objetivos foi ajudar-te para que não desistisses do curso que tanto amas (...) ver-te em pé a fazer frente aos obstáculos, a tentar, deixa-me espantada; acredita que se fosse outra pessoa qualquer já teria baixado os braços e desistido"; ou como uma irmã "está atenta ao teu correio, enviei-te um mimo para ajudar no teu incentivo ao estudo (...) somos família do coração ou não somos?"; ou ainda reencontrar pessoas que foram imensamente importantes na nossa vida mas que, por circunstâncias naturais, as deixámos de ver (obrigado professor por me ter ensinado algumas coisas de matemática e outras coisas da vida; como por exemplo, saber ser e estar, através do seu exemplo). 
A vida é linda, e só agora pude enxergar essa beleza. De dia para dia renasço, e o melhor de tudo é que nunca estou sozinha, como sempre achei toda a vida. Bastou olhar à volta, começar a vibrar noutro comprimento de onda e a magia aconteceu; acontece todos os dias. 
Se é fácil viver? Não; mas se fosse, qual seria a piada? Pois é, nenhuma. 





ML

"Foste o homem que até hoje mais prazer e dor me deu, e que mais lágrimas me vez verter", disse-te eu, com a voz embargada. E do outro lado do telemóvel ouvi o teu suspiro desiludido. Desde que me lembre, sempre foi assim: fazias alguma coisa estúpida que me magoava; depois arrependias-te e corrias mundo afora, por entre lágrimas, só para obter o meu perdão; eu perdoava sempre; selávamos a nossa reconciliação com suor e depois ganhavas juízo, até à próxima borrada. Perdoava? Sim, por amor. Porque o amor é assim; perdoa genuinamente.
Não estava escrito, não era suposto apaixonar-nos... Tu e eu sabemos isso. Mas aconteceu. E aconteceu tudo de uma forma tão louca, tão mágica, tão bonita: como só o amor deve ser. Mas, como há sempre um "mas" em todas as histórias potencialmente felizes, não estava escrito. E não estava certo, eu sei.
Lembro-me da primeira vez que nos vimos; apaixonaste-te primeiro, depois fui eu, e ainda consigo sentir essa paixão impregnada em tudo o que sou. Tocaste a minha alma e eu toquei a tua; soubemos tocar-nos; tens noção do quão raro isso é? Há casais que andam uma vida inteira casados, ali, ao lado um do outro, sem nunca se encontrarem; um à espera de mais e mais da parte do outro, quando o outro é  (ou quer ser, sei lá) limitado no dar; casais que não se permitem sentir tudo em pleno e ao fim de uns anos acabam por perceber que não sentiram nada; casais que vivem na solidão mas que fingem que nada se passa, que tudo é normal (resumem-se ao que é normal, o que equivale dizer, aniquilam-se); casais que esperam, e nem sabem muito bem pelo que esperam! Eu não esperei: eu dei-te. Pus tudo aquilo que sou em cada frase dita, em cada olhar; em cada música que te cantei; mesmo sabendo que não estava certo, que os socialismos diziam claramente que não era permitido amar um homem naquelas circunstâncias, eu amei; e tu não viste.
A vida passou-te ao lado; o meu amor passou-te ao lado. Porquê? Onde andavas tu?
Ambos sabemos por onde andaste; perdido? Muito. E eu remava, remava... Mas chega a uma altura que os braços ficam cansados de tanto remarem em sentido contrário, o barco tomba, e nestas coisas do amor há sempre um que não sabe nadar, e afoga-se. E com a morte, vai-se tudo!
Eu não retiro a culpa que tive ao magoar-te; se há coisa que tenho é humildade para assumir o que faço! Naquele dia, (que ambos sabemos qual) dei-te a verdade por muito dura que tenha sido; porque tu merecias tê-la e libertei-te, libertando-me também, e por isso não fazia mais sentido existir um "nós".
Mas tu querias o "nós", bateste o pé, reviraste tudo (até a minha vida), só para o ter. Tivemos. Até ao momento em que percebi que, afinal, tu não te libertaste a ti próprio. Ficaste preso lá atrás, às memórias más; deixaste que os fantasmas do medo e da desconfiança viessem habitar a tua alma cheia de espaços; não me acompanhaste até aqui, onde estou.

Sabes o que me deixa descansada? É que cumpri a minha promessa; honestidade, acima de tudo.
Lamento que o teu ego, o teu orgulho ferido não permitam que enxergues a minha verdade e com isso cegues também a tua; lamento que ainda me culpes por tudo o que fiz (acaso foste santo?); lamento que tenhas ficado preso lá atrás quando te dei todas as asas para voar e ser uma coisa que duvido que alguma vez tenhas sido: feliz. Lamento, mas não me culpo. E sabes porquê? Porque aprendi a amar-me; porque percebi que tu nunca enxergas-te a minha verdade (aquela que fiz questão de te mostrar, com comportamento e atitudes) e que os sinais que te fui dando, muitos te passaram ao lado e outros valorizaste pouco porque, no teu entendimento "não fui direta". Há coisas que até um cego consegue ver, porque permite-se sentir!
O meu pai sempre me disse: nunca dês o peixe, dá antes a cana e ensina a pescar. Foi o tudo o que fiz; ensinar-te a "pescar-me" um bocadinho todos os dias. Mas partiste todas as canas que te fui dando, e o que sobrou foram resquícios de um sentimento bonito, largado como se fosse areia do deserto: infértil. E tínhamos tanto para plantar... Quem sabe, talvez um dia, pudéssemos ter tido a oportunidade de dormitar debaixo das nossas árvores bem enraizadas e bem cuidadas. Nunca saberemos.
Para ti, desejo os melhores frutos que a vida te possa dar; que todas as tuas chagas se curem e sarem; que possas dar de beber a outra alma sedenta de amor e que se contente com o que tens para dar; que toda a culpa que centraste em mim se evapore e que enxergues a luz. Porque é disso que estás a precisar; iluminares-te.
Quanto a mim, só posso dizer que apesar de lamentar, farei de tudo para me levantar como manda as boas lições da vida. Culpa? Não a carrego mais; deixei-a naquela noite ao pé da fonte, com a convicção de que não sou perfeita mas que a ti, dei sempre o melhor. E só isso me basta para dormir tranquila.






ML



segunda-feira, 9 de junho de 2014

Sempre me confundiste, sabes? Aquela mania impertinente de me dares os teus chamados "bons conselhos" e depois agires ao contrário daquilo que me aconselhavas a fazer, aquela loucura desenfreada de me protegeres por ser "a menina" e depois meteres os pés pelas mãos porque davas o que não fazia sentido e não davas aquilo que realmente precisei durante estes anos todos: colo.
Confuso? Muito.
Foi sempre nesta base que cresci. E sabes o que me dói mais? É que depois de tudo o que se passou no último mês, em que viste aquilo que chamavas de "lar" desmoronar-se, não mudaste nadinha. Pensei eu, na minha ingenuidade, que depois de veres tudo aquilo em que acreditavas cair aos teus pés em pedaços, como uma redoma quebrada e preservada por ti durante anos, que irias arregalar bem os olhos e ver aquilo em que te tornaste ao longo do tempo; aquilo que nunca foste mas que ainda vais a tempo de o ser; todos os segredos podres que a tua casa guardava, e com isso crescesses e me alcançasses, aqui, onde estou.
Mas não. Continuas no mesmo circulo vicioso; habitas a mesma espiral que sempre habitaste, desde que te conheço por gente: vitimização e culpabilização dos outros por tudo de mau que te aconteceu e acontece na vida. E sabes que mais? Foi isso, a única coisa que me ensinaste: viver numa espiral de culpas e a vitima principal ser eu.
Lembras-te da nossa conversa de à 3 semanas atrás, depois da tua casa ter ido abaixo? Eu lembro-me: tu choravas compulsivamente como uma criança e eu abracei-te e fiz algo que nunca fizeste comigo; abri-me. Contei-te de tudo aquilo que me magoou estes anos todos, da solidão em que vivi, da falta de afeto, dos medos, das frustrações, do silêncio a que me remeti sempre que alguém ou alguma coisa me magoava, contei-te sobre as tuas falhas, contei-te os meus segredos. Depois foste tu que te abriste; "o que me levou à depressão foi ter visto, com os meus próprios olhos, que o teu casamento se desmoronou e eu não queria que isso acontecesse porque gosto muito dele e queria que fosses feliz", disseste-me tu. E depois disso, apertei-te contra mim e chorámos as duas; eu por estar aliviada e tu por estares magoada. Foram muitas revelações, eu sei.
Mas naquele dia eu vim para a minha casa, renovada de esperanças "finalmente, ela acordou para a vida!", e esperei que nos próximos dias pudéssemos conversar melhor sobre aquilo que me tinhas dito porque eu sei que naquele dia, não era o dia.
O dia foi ontem; voltámos a falar sobre a tua revelação. E foi aí que percebi que nada do que eu disse valeu a pena, e sabes porquê? Porque continuas a mesma.
Tu não percebes que a vida é minha e que as escolhas sou eu que as faço, sejam elas certas ou erradas. E a isso chama-se crescer. Em algum momento perguntaste-te "será que ela é feliz?". Não. Porque só te preocupaste com o que "querias". Mas tenho uma má notícia para ti: na minha vida tu não queres nada.
Deixa-me dizer-te que, apesar de não teres desempenhado o teu papel, eu cresci. E doeu para caraças! Tudo o que sei tive que descobrir por mim mesma, ver com os meus próprios olhos, apalpar, sentir, experimentar... Fui a minha própria mãe, sem saber muito bem como isso se fazia! Mas cheguei aqui. Não inteira, mas consciente daquilo que quero ser (feliz) e daquilo que não quero ser (como tu).
Parei de me vitimizar e por mais que, inconscientemente, me culpes pelo teu estado, eu não vou sentir essa culpa! Porque, tal como te disse ontem, a vida é minha e sou eu que comando o meu barco, sou eu que decido quem entra e quem sai. Sou eu que estou na minha própria pele; fui eu que passei por tudo aquilo que agora já sabes; fui eu que te carreguei ao colo durante este tempo todo sem perceber o porquê de estares assim, quando muitas vezes quem precisava de colo era eu. Estou cansada de ser para ti o que não soubeste ser para mim: mãe.
E por isso, eu decidi hoje que não me vou culpar, não vou permanecer mais na tua retaguarda à espera que mudes e que me enxergues de mulher para mulher, não vou deixar que o teu pranto se transforme num mediador das minhas decisões. Vou cuidar de mim, mãe: vou-me permitir ser feliz com aquilo que a vida me der; vou-me permitir sonhar e concretizar sem que me prendas as asas como fizeste toda a tua vida; vou-me permitir em ser aquilo que o meu filho precisar; vou-me permitir amar, a mim e aos outros, sem medo.
Medo; foi sempre o que te prendeu. A mim, ele não prende mais.





ML


sábado, 7 de junho de 2014

Tu...

...assombras-me! Já se passaram quase 3 anos desde aquele dia (18 de setembro, lembras-te?) em que te conheci; e pareces-me tão presente... Ainda consigo sentir cada traço teu; o teu cheiro; a forma do teu sorriso a abrir-se e as covinhas que se formavam; o teu toque; a chuva que caía; a praia que se estendia à nossa frente vazia de tudo: só nós e o mar; o estilo de música dos anos 80 que tanto gostavas (ainda adoras Otis Redding?); o nosso beijo (lembras-te de quantos foram? Eu perdi a conta.); a forma como o meu corpo reagia ao teu e o teu ao meu; as horas que passaram num ápice enquanto permanecíamos abraçados e cobertos com uma manta de improviso que andava sempre contigo no jipe (ainda tem o nosso cheiro?) a ouvir a tua música (aquela por que me apaixonei, depois de me teres deixado)...   Ainda te sinto. E isto é tão frustrante! Porque a força de te querer ainda é maior do que a força de te deixar ir.
Ao longo do tempo, desde que te afastaste, eu pensei estar a fazer uma cura interior; como se estivesse encerrada para limpezas profundas. Mas ontem, voltaste. Não fisicamente, mas num formato pior: memórias. Fazem-me sorrir e chorar ao mesmo tempo, sabes?
Eu nunca soube nem saberei porque é que não me quiseste como eu te quis, nunca vou saber porque decidiste partir, nunca vou saber a tua verdade. Deixaste-me aqui com os sonhos todos na palma da mão, com resquícios da imagem que pintaste na minha tela, as fotografias e as músicas guardei-as todas junto ao peito; porque é lá que te mantenho seguro e longe da vista. Esqueceste-te de me ensinar de como se vive sem ti! 
Aquela última mensagem que me mandaste "A sério, és tão fofa. Eu sei que nunca irei encontrar ninguém como tu. Obrigada". 
"Obrigada", era tudo o que tinhas para mim... E eu ali entendi que não podias dar mais nada, não que não o tivesses; mas tinhas medo de dar. 
Durante muito tempo culpei-me: talvez a culpa fosse minha por não ser tão bonita o quanto desejarias que fosse; talvez porque tenho um filho e achavas que seriam responsabilidades a mais para aquilo que conseguias suportar; talvez não tenha tido a capacidade de te fazer apaixonar por mim; talvez porque os teus planos comigo não passavam do que tivemos: um momento. Mas hoje não me culpo mais; deixei de o fazer. E sabes porquê? Porque eu percebi que te amei mais do que a mim própria. E no amor não é suposto deixar-mo-nos de amar em prol do outro; não é suposto apanhar as migalhas que o outro vai dando para nos mantermos vivos, quando na verdade morremos um pouco mais a cada dia que passa por causa da ausência; não é suposto deixarmos de ser para o outro habitar em nós. 
Migalhas; foi tudo o que me deste para me manter, e disso nenhum dos dois tem dúvida. Valha-nos a humildade para percebermos e aceitarmos isso!

Queres saber? Já nada importa. Não importa que não me quisesses, não importa que já não estejas ou que eu não tenha sido o suficiente para te fazer ficar. Eu preparei-me, por entre sombras, para te deixar ir. E está na altura de abrir asas e ir, porque a luz chama-me; e quanto a ti... Serás tudo aquilo que quiseres sem mim e passarás a ser para mim algo que não posso tocar: memórias. Mas ou vou agora ou ficarei amarrada a ti para sempre, e eu mereço melhor. Talvez, um dia, possas virar para mim aquilo que já sou para ti há muito tempo: pó.



ML